A cada 24 horas, nove crianças com menos de um ano de idade, filhos de adolescentes, morrem no Brasil. Em 2009, morreram 42.684 bebês - 20% deles eram filhos de meninas de 10 a 19 anos. Os dados fazem parte do levantamento "Estudo sobre as políticas públicas de proteção à saúde infantil e materna no Brasil: um olhar especial para os filhos de mães adolescentes", divulgado hoje pela organização não-governamental (ONG) Visão Mundial, no Recife.
"Estamos falando do direito à
sobrevivência e ao desenvolvimento da criança e do adolescente. Porque
esses números mostram que houve dupla violação. Trata-se de uma morte
infantil que não deveria acontecer e da violação aos direitos da
adolescente, que não tem uma política pública focada na sua
particularidade, que é a de uma mulher em desenvolvimento", afirmou a
assistente social Neilza Costa, coordenadora técnica do estudo.
Os
pesquisadores se debruçaram sobre dados do Sistema Único de Saúde e de
outras fontes, como o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Foi possível observar, por exemplo, que, embora a gravidez na
adolescência venha diminuindo nos últimos anos - 20% entre 2003 e 2009
-, esse fenômeno se concentrou na faixa etária de 15 a 19 anos. "Entre
as adolescentes de 10 a 14 anos está aumentando a gravidez como também
está aumentando a quase 1% ao ano o número de óbitos do bebê filho dessa
adolescente", disse Neilza.
O estudo cita um dado de 2007,
quando meninas de até 14 anos foram mães de 28 mil crianças. "Desses,
625, 628 morrem antes de completar um ano. Não é um número descartável."
O levantamento mostra ainda que nem todos esses bebês representam a
primeira gestação - para 233 meninas aquela era a segunda gravidez.
O
levantamento traça também o perfil da grávida adolescente: são de
famílias empobrecidas, mais da metade delas são negras ou pardas e 49%
estão no Norte e Nordeste. O Sudeste tem o menor registro de mãe
adolescente (16,56%), seguido pelo Sul, com 19,85%. A média no Brasil é
de 19,92%. "O número de filhos de adolescentes que morre é muito grande,
e 60% dessas mortes são evitáveis. São crianças que morrem
desnecessariamente como expressão das desigualdades sociais", afirmou
Neilza.
O estudo faz parte dos esforços da campanha "Saúde
para as Crianças Primeiro", da ONG Visão Mundial. "É preciso que o
Ministério da Saúde tenha programas específicos para captar mais cedo
essa menina para que ela faça o pré-natal e que tenha um pré-natal
diferenciado, multidisciplinar", defendeu Neilza.
Defesa
Ana
Luiza Lemos Serra, coordenadora substituta de atenção à saúde do
adolescente do Ministério da Saúde, disse que a pasta tem iniciativas
voltadas para esse público, como o Programa de Saúde na Escola e
distribuição de cinco milhões de cadernetas de saúde do adolescente, com
instruções para o autocuidado. Mas a grande dificuldade tem sido
sensibilizar o profissional de saúde.
"Enfrentamos uma
barreira que é a questão ética e moral. Alguns profissionais não
concebem que uma adolescente de 11 anos possa ter relações sexuais e
impedem o acesso ao contraceptivo, à informação. A gente lida com uma
questão de valores. Estamos atuando para sensibilizar esse profissional
para que tenha um olhar diferenciado", afirmou.